Thursday, July 05, 2007

Terceiro ato

O sol tinha raiado há umas poucas horas, e ele mal conseguira dormir. Estava se arrumando, batendo as roupas para tirar a poeira da estrada, esfregando as botas, lustrando a fivela do cinto.

Havia até tomado banho no lago, sentia-se renovado. Estava pronto. Bem vestido, não que seja possível dizer que um quase-peregrino como ele possa ficar bem vestido, mas estava mais alinhado do que o normal. O que causava outra impressão.

Com o cavalo selado desde a noite anterior, ele deixara a hospedaria na qual se alojará há dias já. Trotando sob o morno e acolhedor sol dessa manha de primavera, ele ia cantarolando uma cantiga qualquer. Foi quando de súbito lembrou-se!

Batendo os calcanhares contra as costelas do cavalo, saiu em disparada campina acima, e então parou. Desceu da montaria e sorriu feliz:

- Flores! Como pude esquecer!

Ele colheu várias, amarelas e brancas. E uns ramos verdes de um mato qualquer.
Juntou as flores e as enrolou num lenço vermelho, tirado de seu bolso.
Então, voltou até seu cavalo e pode prosseguir sua viagem.

Trotando mansamente, seu destino era a cidade. Bem próximo da praça onde a feira era feita. Ele chegaria em uma, ou duas horas no máximo. Centenas de pessoas circulavam por lá todos os dias, fazendo parecer um formigueiro, até o cair do sol, quando o centro da cidade parecia deserto.

A estrada seria monótona, se não fossem as variações do relevo ao longo do caminho. Algumas pedras, uns animais correndo por entre arbustos e as vezes um casebre ou outro.

Ele já podia ouvir as vozes dos vendedores anunciando seus peixes, frutos, vasos e jóias. Essa cidade não possuía portões, começava da mesma forma que terminava: com casas não planejadas espalhadas por perto do rio que ali passava. O centro do vilarejo já não ficava mais tão no centro, pois o crescimento era desenfreado e sempre seguindo o curso do rio.
Então ele chegou à grande feira. Um evento diário e popular, com certa fama por outras terras, devido ao seu tamanho, tradição e variedade.
Os vendedores mais antigos não ficavam nas barracas, mas já tinha lojas feitas em pequenas casinhas por ali mesmo. Havia algumas poucas, mas eram bem freqüentadas.

Ele desceu do cavalo e caminhou calmamente, puxando o animal por entre barracas, crianças correndo com frutas aos gritos de feirantes, e senhores de bigode grosso e tapetes enrolados nos ombros. Parou perto do chafariz com cavalinhos de mármore, que cuspiam água, e sentou-se para observar. Esperou, esperou e esperou... Foi quando seus olhos brilharam e sua boca abriu. Expressão incrédula, seu corpo paralisou.

De cabelos doirados como o sol, olhos verdes como folhas, corpo esguio e pele branca. O jovem fidalgo não era o único a admirá-la de longe. Sem coragem o bastante para tentar uma aproximação ele passaria o dia ali, sentando recebendo respingos de água dos cavalinhos de mármore.

Olhou para as flores, sendo que seu cavalo já mastigava uma para se entreter, pegou-as com determinação. Levantou. Puxou as rédeas do animal, e com as pernas trêmulas e sorriso confiante foi em direção à sua sonhada donzela. Aquela que havia tirado seu sono por longas noites.

Olhou para as flores, e estava certo de que não podia ter escolhido melhor. Pensou até em alguns versinhos para dizer-lhe, mas achou que seria ousado demais. E também porque achou que suas rimas não eram das mais ricas.

Ela regava alguns vasos e arrancava as folhas mortas de umas plantas, postas em frente à loja. Ela era mais bonita ainda de perto. Seu perfume pairava no ar. Seus cabelos eram macios e escorriam por sobre seus ombros. Um sorriso cativante e maçãs do rosto rosadas como as de um bebê. Parecia um anjo.

Ele só precisava dar mais alguns passos, e parar de sorrir como se estivesse em frente à uma pilha de ouro. Foi quando ela o interpelou, serenamente. Ele se deu conta de que já estava em frente à loja, e completamente paralisado.

Ela estranhou, sorriu e repetiu a pergunta. Enquanto ele parecia imitar uma estátua. O cavalo relinchou e o rapaz se assustou. Foi então, que um homem alto, robusto e de queixo largo saiu de dentro da loja, para ver o que acontecia.
Ele se aproximou dos dois, e perguntou se aquele bom homem com um cavalo escandaloso e flores na mão procurava por algo naquela loja.

Trêmulo, ele perguntou o valor daqueles vasos. Recebeu uma simpática resposta do homem, que brincou com ele, falando das flores:

- Aposto que está levando para sua namorada, meu jovem! Nota-se que você sabe cortejar uma donzela. Não perca esse dom!

É bem provável que fosse parte da péssima lábia dos vendedores locais. Mas foi simpático da parte dele tentar deixar o rapaz menos tenso. Em seguida ele puxou a mocinha pela cintura e a ergueu no colo, em seguida a beijando. A pôs no chão novamente, e voltava para o interior da loja, antes dizendo que sempre que precisasse de vasos e plantas, o rapaz poderia ir até lá que seria bem atendido.
Então o jovem agradeceu. Olhou para ela uma última vez, e num sorriso amargurado pôs-se a puxar o cavalo.

Flores na mão, ele as admirava. Com um andar fúnebre, lembrava do doce sorriso de sua “ex-donzela”. Deixou as flores sobre uma mesa de pedra, montou o cavalo e debruçou-se sobre as costas do animal, o acariciando.

- Pelo menos eu tenho companhia pra voltar pra casa. E que não reclama...

3 Comments:

At 7/05/2007 9:10 PM, Blogger Dani said...

considero uma companhia agradável quando não tem algo pendurado no meio das pernas, logo, cavalo, você está fora!

 
At 8/13/2007 8:20 AM, Anonymous Anonymous said...

e eu tive que ler isso...

durante cansativos vários minutos, e enquanto a professora ria sem parar

 
At 10/07/2008 6:03 PM, Anonymous Anonymous said...

Olá ^^

Gostei do seu txto, passa lá no meu fotolog, caso queira ^^

Bjinhosss

 

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